Apresentando um olhar distinto, cineasta francesa inverte valores e discute o temor do branco colonizador perante o negro colonizado em país africano

  • Redação
  • 23/07/2012 11:37
  • Cinemografia

Sinopse: Um país africano é devastado por constantes rebeliões. Maria Vial (Isabelle Huppert) vive com seu marido André (Christopher Lambert) e o filho Manuel (Nicolas Duvauchelle) em uma fazenda, localizada na província onde nasceu um dos principais líderes do conflito. Apesar do perigo constante que os cerca, ela se recusa a deixar as plantações de café, que estão em sua família há três gerações. Até que André, sem que ela saiba, começa a arquitetar um meio para que deixem o local.

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Política, sociedade e cinema podem e devem andar juntas, especialmente por esta ser uma expressão artística que traz muito do olhar cotidiano, que resgata a história e que apresenta novas formas de interpretação e, principalmente, discussões e debates. Sendo assim, nada mais justo e interessante tratar do contraponto entre brancos (colonizadores) e negros (nativos) de um determinado país africano, onde desta vez o terror incorre ao contrário: a "vítima" agora é uma família composta por pessoas de cor branca.

O casal interpretado por Isabelle Huppert (A Professora de Piano) e Christophe Lambert (o eterno Connor McLeod do filme Highlander, o Guerreiro Imortal) na verdade administram uma plantação de café e, em meio a uma rebelião civil no país africano, decidem ir em contramão e não voltar à França, mantendo a fazenda em atividade, ocasionando numa série de problemas tanto com os locais quanto infrafamiliares. As divergências de opiniões entre as personagens de Huppert e Lambert são bem conduzidas, dando credibilidade aquele momento tenso na vida destes e destacando a individualidade e princípios de cada um, não sendo em nenhum momento "vilanizada" as escolhas morais destes.

No entanto, apesar do contexto interessantíssimo e da importância do tema abordado - até hoje o continente africano sofre com os constantes conflitos armados, sejam tribais ou separatistas -,Minha Terra, África (White Material, no original, que se refere ao próprio homem branco) sofre no que tange a seu estilo narrativo, sendo obviamente adotado pela cineasta francesa Claire Denis (O Intruso) uma perspectiva bastante centrada no subjetivismo, o que conota a obra um aspecto plástico e artístico, mas ao meu ver acaba por fragilizar um pouco o discurso da obra, deixando o espectador (em especial o estrangeiro) com poucas informações concretas que o ajudem a digerir melhor a trama apresentada. É óbvio que esta perspectiva analítica não é unanimidade, pelo contrário, já que Minha Terra, África obteve uma excelente cotação perante a crítica em todo o mundo, como pode ser visto no agregador Rotten Tomatoes, por exemplo. Entretanto, para mim, esta opção acabou por fragilizar mais o longa do que diferenciá-lo das demais produções que abraçam discussão semelhante.

Dentre abordagem poética e certo estilo documental de filmagem (muita câmera na mão, com destaque à cena em que a personagem de Isabelle Huppert passeia de bicicleta, nos minutos iniciais do filme), para mim o ponto de destaque de Minha Terra, África encontra-se na direção e escalação de elenco, que realmente transmitem a angústia e expectativa, além de terror e medo que possivelmente sentiria qualquer pessoa que estivesse naquele local e naquele exato momento pelo qual estava passando o país africano (nunca citado) do filme. Contudo, dentre os membros deste elenco, não há como não destacar os belos trabalhos de Huppert - que passa com muita sutiliza e verdade, tanto nos trejeitos quanto nos olhares, a angústia advinda do peso advindo de sua responsabilidade como "líder" da família e da fazenda em que trabalha nestes tempos de incertezas - e, talvez a grande surpresa do filme, de Christophe Lambert (neste trabalho não assinando Christopher), que longe dos papeis de ação ou de filmes pouco densos - leia-se B mesmo- em que vinha trabalhando pelo menos nas últimas duas décadas, transmite uma profundidade incrível ao criar uma personalidade dúbia e distante como o marido da personagem de Huppert.

Dono de uma desfecho no mínimo chocante e que com toda certeza exigirá do espectador alguns momentos de reflexão e, quiçá debates, Minha Terra, África é uma obra interessante, dona de uma mensagem forte (mesmo que não tão clara) e que desperta sentimentos diversos ao espectador, mas que também peca um pouco pela falta de coesão, tornando-se dispersa em alguns momentos. Típico filme que carece de muita sensibilidade por parte do espectador, este trabalho de Claire Denis não me despertou tanto interesse, mas é relevante, tem méritos e merece ser apreciado, principalmente pela possibilidade que o mesmo dá de inúmeras interpretações e, principalmente, sentimentos despertados durante sua assistida.

Nota: 6.

LINKS:
http://www.rottentomatoes.com/m/white_material/
http://www.imdb.com/title/tt1135952/